sábado, 11 de setembro de 2010

Vivendo o filme CaTástroFE


Sobressalto. Atrasado. Copo de cálcio. Porta fora e metrô.
Entro pela sala de aula. Cadê o professor?
Um avião colidiu com o World Trade Center, disse o colega.
Tinha passado em Tribeca há pouco, quando ainda no trem.
Outro aspirante a cineasta abre a porta da sala. Um segundo avião acaba de colidir, diz ele.
Todos se dirigem para uma das salas de projeção. Telão grande, capacidade para 200 pessoas assistirem os replays da CNN. O avião bate. De outro ângulo. Contra plongé. O outro avião se espatifa. Fumaça. Gritaria.
Viro para um japonês da minha turma. Eu tinha ajudado a colocar o curta super 8 dele nas projeções de final de ano. Ele, grato, me ofereceu uma carona que recusei para não dar trabalho. Dessa vez era diferente. Cobrei a carona daquela noite e ele fez questão de me levar. A fumaça de Manhattan era vista de qualquer ponto do Brooklyn.
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Quando morar em Nova York era apenas um sonho e eu ainda era um turista, passei pelo túnel que liga a New Jersey. Meu pai divagou numa ideia para um filme: e se o túnel explodisse e as pessoas ficassem presas circundadas por água (o túnel atravessa por baixo d'água). Uns anos depois essa mesma ideia foi usada em Daylight com o Stallone. Eles basearam muitas das sequências de ação num filme chamado O Destino do Poseidon com o Gene Hackman (que por sua vez teve um remake em 2006 chamado de Poseidon).
Os filmes catástrofe tiveram o seu auge na década de 70 que contou com os sucessos Inferno na Torre, Terremoto, Aeroporto 74 e o próprio Poseidon Adventure. Os títulos explicitavam onde ocorreriam a mais nova catástrofe repleta de efeitos especiais.
Não foram estas as imagens que se passaram por minha cabeça, no entanto.
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Pensa-se no que está acontecendo. Não foi preciso ser um gênio para deduzir que a probabilidade de dois aviões baterem por acidente nas torres gêmeas era reduzida.
Tão atacando essa porra! Tô no Brooklyn College, subúrbio, sem monumentos de grande importância à minha volta. Rota até a minha casa em Queens, subúrbio. Se eu morasse na Times Square ou perto do Empire State Building, só apareceria por lá no dia seguinte. Nunca foi tão seguro morar no subúrbio.
O Japa acelerou para cruzar Brooklyn/Queens. Dois colegas vinham comigo no banco de trás e outro ia no passageiro. Um cara filmava as torres queimando com uma Sony VX2000 enquanto todo mundo falava ao mesmo tempo em japonês. Eu ficava quieto, olhando aqueles dois charutos de concreto.
Uma torre desmoronou. A câmera filmando. Takahiro, o motorista, diminuiu a velocidade para poder olhar. Já não viu. Foi muito rápido.
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Confesso que fiquei excitado pelo enxaropado Titanic. Para mim tinha valido a pena esperar todo aquele romance de três horas só para ver o navio afundar. Os efeitos foram de grande realismo e me impressionaram. Eu devia ter uns 18 anos e ia constantemente a esses filmes para acompanhar a evolução tecnológica dos efeitos. Armageddon, Twister, Inferno de Dante. Acompanhava tudo isso. Sempre na telona, claro.
No entanto veio uma regressão e os efeitos viraram defeitos especiais. O uso da máquina operante computadorizada ajudou a cortar custos ao explodir virtualmente um caminhão que antes era explodido na real. Quando se misturou a filmagem real com o virtual no fim da década de 80, obteve-se resultados extraordinários. Mas, hoje, os grandes estúdios americanos querem fazer tudo no computador e tornam a diagese pouco convincente. Diagese significa a realidade da narrativa compreendida de forma externa (essa veio da época das minhas aulas de Film Theory).
Os efeitos de hoje em dia não convencem e filmes catástrofe como 2012, se tornam entediantes (bem fraquinha aquela cena do Cristo desmoronando).
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O carro atravessava a highway e com muita sorte passávamos no momento exato que a polícia fechava os acessos. Passamos uns cinco até que não teve mais jeito e tivemos que dar uma baita volta pelo norte de Queens.
Cheguei em casa. A Dora, que dividia o apartamento comigo, estava vidrada na televisão. Sentei ao lado dela. Ficamos um tempo em silêncio até ela dizer - Vim a pé para casa. Andei pra cacete. Eles fecharam o metrô e as pontes. Voltei a fumar de tão nervosa.
Voltamos ao silêncio. Eu acendi um cigarro. O cheiro da fumaça do tabaco era fraca em comparação ao cheiro indescritível que vinha do World Trade Center, que estava do outro lado do rio. Aquele cheiro permaneceu em todos os cantos da cidade por uma semana. O olfato fazia com que todos fizessem parte da tragédia.

Astoria, Queens, 11 de Setembro de 2001

Quadro abstrato do Poseidon: http://www.cinemademerde.com/Beyond_Poseidon_Adventure-abstract.gif

6 comentários:

  1. Eu até lembro disso. e lembro também que o povo em Viçosa achou que você tinha explodido junto com as torres...e ficava eu e breno lá " não o cara ta vivo..."
    E por falar nisso, to achando seus textos melhores que os filmes rsrsrs

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  2. o que importa é que você goste de alguma coisa.

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  3. Não gosto de 2001. Primeiro o medo por você pois até onde eu sabia vc trabalhava naquela área e não era sua hora de estar lá mas nunca se sabe. Até falar com você, te ouvir. Depois o novembro negro, esse não teve como escapar. Gosto de tudo em você, inclusive os defeitos.

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  4. Manda aí o Ferocidade. É o unico jeito de assitir pq não tenho acesso a festivais de cinema... Prometo que não vai sair do meu hd!

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  5. Calma, garotinho. Vamos nos encontrar em breve. Vamos combinar em Viçosa. Abraço

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  6. Novembro negro? Esse nem eu sei do que você está falando...

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